O file à parmegiana é um das geniais criações da nossa cozinha e democrático como só ele:
Molho só na cobertura ou o empanado imerso nele?
Com presunto, sem ou tanto faz?
Acompanha purê?
Tá valendo parmegiana de frango, de peixe e berinjela?
Escolhas à parte, de uma coisa não abro mão: tem que vir em porção familiar e cortado com colher na frente do freguês pra mostrar que ali não tem trucagem, tem é filé do bom. A arte de manejar as duas colheres, de dominar o fio rebelde de queijo e de banhar a porção com o molho do fundo da vasilha é uma cena bonita de se apreciar. E assim como o time de futebol, a eleição do seu parmegiana de coração é algo que não se explica, sente.
Acontece que por aqui rolou uma virada de casaca nessa altura do campeonato, vocês podem imaginar? Era fiel ao Restaurante Fazendinha, lugar daqueles que se pode pedir anchovas e pernas de rã pra petiscar enquanto aguarda o filé à francesa para o jantar. Vintage, démodé, de raiz ou como queira chamar; eu atravessava a cidade e defendia com orgulho que melhor parmegiana não há.
Eis que domingo, distraidamente bebericava num ambiente familiar, o Bar do Antônio Pé de Cana, patrimônio de BH. Mesmo já tendo sido vizinha e ter certa milhagem por lá, nunca tinha comido o parmegiana, por mais que já tivesse ouvido falar. Era como trair o Fazendinha, pedir esse prato em outro lugar. Num delírio primaveril cometi o pedido. O garçom pediu licença para fazer uma “assepsia” (Sic) da nossa mesa – talvez quisesse dizer alma – e eu concordei atônita como alguém que acabara de ser pega no pulo.
Então chega uma panela flamejante, brilhante, obscena. Muito molho, muito queijo, deleite, gemido, presunto, casquinha, suspiro, carne, sabor, muito. Purê para a alegria dos puristas. Ritual de apresentação e serviço finamente executados. Quando vi, já foi. Pé de Cana, arrebatastes o meu espírito e eu, como boa pecadora que sou, me entrego às fraquezas da carne e do meu insensato coração.
