Se alguém ainda não viu o vídeo do título acima, dá uma googada rápida aí. O garotinho resumiu em duas frases as minhas maiores certezas da vida: “boca foi feita pra cumê. Eu fui feito pra cumê”. Dito isso, declaro que achei absolutamente genial a escolha do nome do mais recente e original espaço gastronômico de Belo Horizonte (que fica em Nova Lima, mas c’est tout la même chose): MERCADO DA BOCA.
Estive lá no primeiro final de semana de abertura ao público. Com um frio na barriga confesso, porque minha expectativa era de estar a caminho de um show dos Rolling Stones, gratuito, na praça principal do centro de Tóquio no único feriado anual do calendário japonês (não sei se eles curtem Stones, mas não perderiam a oportunidade de tirar fotos, né?). BH adora uma novidade e a gente merece muito.
Com a tática de guerrilha traçada, cheguei ao Boca exatos 03 minutos após a abertura, já contando com o tempo de estacionar o carro. Parei no serviço de valet, que fica no subsolo do mercado para ganhar tempo na minha cruzada. Não recomendo, 10 pilas a hora, mas a causa era maior. Os guichês (em número suficiente e presentes nos dois pisos) já apresentavam pequenas filas. Marido fez cara de choque, acho que na encarnação passada ele foi o pequeno Nikolai, obrigado por sua mãe a enfrentar diariamente a gigantesca fila do pão durante o regime soviético. Traumatizou, coitado.
Compramos o cartão de acesso (fof’s) carregamos com bem muitos dinheiros porque a gente tinha o pressentimento que a farra ia ser boa. Vale registrar que ficam circulando várias pessoas com boquinhas ao estilo antenas de Chapolin para recarregar o seu cartão de pronto. Então, se você tem filhos lembre da cara deles quando viram papai noel pela primeira vez. Se não tem, puxa aí a memória da sua infância. Situou? Era esse o nosso semblante admirando aquela vastidão de “lujinhas”. Mexicano, brasileiro, espanhol, italiano, português, francês, refugiado… uma verdadeira ONU gastronômica. E assim ficamos, em estado de graça, rodando como peões encantados ao sabor dos prazeres da Boca.
De repente piscamos os olhos e vimos que o lugar estava cheio, como esperado. A gente ainda não tinha comido nada, somente tacinhas de vinho dançando nas mãos. Nikolai reincorporou e tratamos de fazer uma escolha apressada, retomar a nossa tática de guerrilha e sair em busca de abrigo (akalugar para sentar). Lá eles usam o sistema de enviar um SMS para seu o celular quando o pedido estiver pronto, melhor impossível.
As mesas funcionam de forma compartilhada, mas geral não entendeu isso ainda. Vimos vários lugares vazios, pedimos licença para sentar e a resposta foi a mesma: tem gente! Gente invisível, novo gênero na praça. Depois as pessoas passaram “marcar” lugares, com bolsas, celulares e até com óculos escuros. Me fez lembrar os tempos de escola que a gente guardava a carteira do lado para o coleguinha mais querido. Enquanto isso o pau comendo lá fora. Filas ziguezagueando o mercado sob o sol da Toscana (com menos glamour, já que beleza natural não é o forte da vizinhança).
Sentamos num cantinho escondido em frente ao espaço da La Macelleria. A localização não era privilegiada, mas era o cheiro era. Senhor! O paraíso deve ter esse cheiro. Abre o olho, treme o celular; chega o SMS, pedido pronto. Mexicano pra compartilhar, foi o que conseguimos decidir de supetão. Tudo muito gostoso, ficou devendo a tortilla de maiz, aparentemente sem a cal que dá a textura correta. Depois, altamente influenciados pelo aroma circundante, comemos um primoroso contrafilé de Wagyu, padrão Flintstones. Depois veio um camarão delícia com molhinho de rapadura e abacaxi, (esqueci de onde) e Stake Tartar, Tártaro
“>Tartar do Alma Chef, bem feito, mas com sal além da conta.
Tacinhas de vinhos educadas para acompanhar os quitutes até depararmos com um charmoso quiosque na curva do segundo andar, em frente a loja de vinhos. Garrafas estampadas com bolinhas de cores variadas fisgaram os meus olhos infantis. Eram sangrias, de vinho branco, tinto e cava. Umas daquelas coisas da vida que quem tem problema com limite não deveria experimentar. Mas como a gente não faz só o que deveria, mergulhamos na sangria.
Foi uma tarde cheia de boas surpresas. Em dada hora, quando estavam com a lotação máxima, seguraram as filas lá de fora e passaram a funcionar no esquema de entrar só o número de pessoas que saíssem. Cuidado fundamental para o bom andamento das coisas, mas raro de se ver. Todo mundo que está envolvido no projeto, os atendentes, empreendedores, chefs, ajudantes, boquinhas Chapolim, pessoal da limpeza, segurança… todos com quem cruzei demonstravam estar muito orgulhos de fazerem parte daquele lugar.
Tudo que pedimos veio gostoso e com um bom tempo de execução. Não vimos tumulto ou confusão, tudo fluindo bacana e coerente com o porte do lugar. O espaço é um capricho só, já frequentei alguns lugares afins na gringa e posso dizer que a minerada tá fazendo bonito. Puxão de orelha para a climatização. Não vi ar condicionado, só ventilação que não foi suficiente pra vencer o calor do dia. Tava um calor da muléstia! A acústica também precisa ser revista (ou feita, porque acho que não houve nenhum tratamento nesse sentido), não dá pra escutar a música ambiente e é preciso falar bem acima do tom.
Não, não é um mercado como ouvi muita gente queixar. O foco não é expor produtos, muitas vezes in natura, para a venda ao público. Mas o conceito despojado, aconchegante e agregador de um mercado está presente ali sim. Se fôssemos nos apegar à definição mais precisa, seria adequado classificar como uma food court, ou praça de alimentação. Mas será mesmo que a gente precisa se ater a tamanho preciosismo?
A gestação foi longa, Mercado da Boca, mas o filho saiu no capricho. Orgulho de ter algo assim por aqui. Sinto um cadinho mãe também (afinal filho bonito tem um monte de gente reivindicando a paternidade, né?) como amante da gastronomia e dos prazeres da boa mesa. Sei que falta muita coisa para ajustar principalmente dado o furor da estreia. Mas, estou boquiaberta com a façanha e desejosa de um sucesso à altura do arrojo e esmero do empreendimento.
Agora de boca vazia, como manda a boa educação, evoco a função secundária da boca pra dizer:
