Nunca rolou família Doriana, e nem era isso que eu queria. Mas eu desejava muito ser percebida por ele. Percebida não, admirada. Ser objeto do seu ósculo matutino e envolvida num amplexo genuíno, parodiando o latim de seminarista, que ele costuma gastar para impressionar a sua plateia. Mas sempre foi difícil dialogar, a gente não se pertencia e quando eu achava que estava me aproximando, mais longe eu percebia estar.
Por força da ironia, comecei a me sentir filha quando me tornei mãe. Embora soubesse que a real pretensão dele, era ser avô. Percebi que o amor que ele não destinava a mim, era lindo de ver manifestado pelo meu filho. E o que é a maternidade senão renunciar ao egoísmo primário, e depreender amorosamente o seu posto de segundo plano?
Aos poucos, foram sobrando alguns restolhos de amor pra mim. Algum mecanismo de transferência involuntária de querer, de alguma forma, agradar àquela que havia lhe concebido a dádiva da avoíce…avoidade? Engraçado que existem a maternidade e a paternidade, mas qual a designação apropriada ao exercício de ser avô? Talvez seja sublime demais para ser nomeado.
Nos cuidados com o rebento, eu mãe sozinha, fui construindo a relação com meu pai. Mais tarde me casei e aquele desespero de ser amada foi se abrandando. Hoje sinto nostalgia em lembrar do tamanho daquela fome de amor. Era imensa, insaciável, primitiva. Me acho patética ao recordar minha adolescência, com a sua urgência abismal, desesperada; e a certeza da definitividade das coisas.
O que acabou nos unindo efetivamente, meu pai e eu, foi a amarra que tínhamos em comum: a escrita. Passamos a trocar cartas e o regozijo de recebê-las e respondê-las era enorme, e mútuo. Nos conhecemos e nos amamos por via da palavra escrita.
Ele se foi há doze anos. Hoje guardo nossas cartas numa caixa em formato de coração, e vez por outra as leio. As minhas cartas e as dele, que foram a única coisa que eu trouxe comigo depois de me despedir dele para sempre. Contudo, ele me deixou muito mais. Me deu uma certeza plácida de que fui muito amada. Me fez sentir admirada e especial. Hoje quem lê os meus escritos costuma dizer que escrevo igual a ele, e esse é o maior legado que eu poderia receber nessa vida.
Feliz dia dos pais Timilar; meu pai imenso, que não cabe em texto algum.
Da sua Pilantra.

Texto maravilhoso que descreve muito bem o sentimento de falta de pertencimento entre pai e filha. Um texto seu para leitoras que se identificam nele e se encontraram também parcialmente inseridas na relação pai-filha após a “avoíce”.
Parabéns amore mio.
Texto maravilhoso que descreve muito bem o sentimento de falta de pertencimento entre pai e filha. Um texto seu para leitoras que se identificam nele e se encontraram também parcialmente inseridas na relação pai-filha após a “avoíce”.
Parabéns amore mio.
Emocionada ? que bom poder ler sobre tanto amor ??
Linda, Timilar rachando de orgulho desta pupila maravilhosa !
Emocionante! É possível sentir afeto em cada palavra.
Adorei o texto
Obrigada Rodrigo! ??
Que o afeto seja a nova pandemia! ???
E a gente rachando de saudades! Obrigada Lolita, querida! ?
Repasse sem moderação! Nunca precisamos de tanto! ?????
Minha deliciosa, musa dos meus áudios bicuda!