Skip to content
Menu
Hanna Litwinski
  • Loja
  • Sobre mim
Hanna Litwinski

Pra não deixar de ser eu — embora preferisse te falar das flores

Posted on novembro 21, 2018maio 11, 2020

Eu queria escrever sobre outra coisa e em outro tom, mas não deu. Estou como boa parte do nosso povo, tomada por esse cenário que se formou. Não tenho conseguido escrever como gostaria, o humor e a beleza que eu sempre busquei abandonaram a minha letra. Desde então tenho feito uma avaliação da extensão dos danos e, por conseguinte das minhas atitudes. Por que eu não consigo ser menos intensa? Pra que essa necessidade de sempre me posicionar? Por que o que eu tenho ouvido por aí, dito de forma tão banal, reverbera em mim como atrocidades?

Quando me dou conta já perdi boa parte do meu dia e manchei minha raspinha de esperança tragada por embates éticos. Dos quais eu prometi que me afastaria ontem e hoje de novo. Já perdi a noção das horas acompanhando entrevistas com sociólogos, historiadores, especialistas políticos, psicanalistas tentando explicar o que ninguém consegue entender e me esquivando de completar com “o que aconteceu ainda está por vir”.

Vejo tudo cru, dito por boca própria. Não precisou de nenhum artifício, distorção da realidade ou de alguma construção conspiratória. Ainda que estejamos craques em fazer isso agora. As pessoas leram o rótulo, sabem o que estão comprando e se orgulham do produto.

Eu não compreendo como é possível achar frescor e votos de mudança em algo que está posto há trinta anos. Nem Balzac entenderia. Me recuso a acreditar que num mundo de possibilidades e ações engenhosas estejam elegendo a repressão como a forma mais eficiente de combate.

Assisto incrédula a repetidos ataques a pensadores e artistas que a despeito da fuzilaria armada quebram o silêncio e expõem a sua aversão ao bizarro espetáculo que tem sido aclamado. Corta pra cena em que voltamos no tempo e assistimos às moças de família que se percebendo sujeitos desejosos de outra sina, tratavam de fugir com uma trupe de circo para conseguir existir. Ao fazer isso imediatamente decretavam a sua morte social entre as famílias de bem. Quando é que cultura e as expressões artísticas voltaram a ser atributos associados à calhordas e hereges? Seria o obscurantismo the new black?

A arte, o livro e o discurso coeso estão ganhando conotações estranhas. Ou porque vêm sendo sistematicamente esvaziados de sentido ou porque passaram a atribuir-lhes uma lógica corrompida com predicados de ameaça. Eu sigo defendendo a importância irrestrita deles seja pela coerência que persigo na vida ou porque boa parte da minha existência, pelo menos a parte de que eu mais gosto é profundamente dependente desses pilares. A subjetividade habita essas formas de linguagem e é através delas que acessamos o nosso material humano.

Tá difícil lidar com essa tristeza intrusa e tenho gasto muita energia pra não sucumbir a ela e deixar de ser eu. Mesmo me vendo cercada de pessoas que deixaram de ser elas, para mim. É uma espécie de paradoxo infeliz perceber que não tenho conseguido suportar a bandeira dessa gente neodiferente. Justo eu que acredito que são as diferenças que colocam vida na vida da gente, percebi que existem diferenças que são mesmo insuportáveis.

A verdade é que as coisas pra mim não são simples. Nunca foram, e isso se tornou um problema maior agora. Nunca consegui enxergar o mundo de forma binária porque acho que isso serve pra máquina e não pra gente. E a ordem vigente parece ser essa: se você não se define por isso, é imediatamente definido por aquilo. Sem conversa ou possibilidade de outras significações.

Andar por aí, sob essa cerração, embalada por um brado expurgatório retumbante, portando minha alma inquieta e carregando o medo no bolso tem se mostrado um enorme desafio de resistência.

Deixe um comentário Cancelar resposta

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Posts recentes

  • Maria Verdade
  • De luz e curvas são feitas as casas e as mulheres – Parrilla Paganini
  • Uma casa de amigos – La cucina di Piero
  • Tôco Maravilha
  • E o salário?

Comentários

  • Anônimo em Tôco Maravilha
  • Anônimo em Tôco Maravilha
  • Claudia Coelho em Tôco Maravilha
  • Liliana em Tôco Maravilha
  • Bruno Ramalho em E o salário?

Arquivos

  • outubro 2025
  • junho 2022
  • maio 2022
  • abril 2022
  • fevereiro 2022
  • janeiro 2022
  • dezembro 2021
  • novembro 2021
  • maio 2021
  • abril 2021
  • março 2021
  • fevereiro 2021
  • janeiro 2021
  • dezembro 2020
  • outubro 2020
  • setembro 2020
  • agosto 2020
  • julho 2020
  • maio 2020
  • abril 2020
  • março 2020
  • janeiro 2020
  • novembro 2019
  • junho 2019
  • maio 2019
  • abril 2019
  • março 2019
  • fevereiro 2019
  • janeiro 2019
  • dezembro 2018
  • novembro 2018
  • outubro 2018
  • setembro 2018
  • agosto 2018
  • julho 2018
  • junho 2018
  • maio 2018
  • abril 2018
  • março 2018
  • fevereiro 2018
  • janeiro 2018
  • dezembro 2017

Categorias

  • Crônicas Gastronômicas
  • ECOS
  • Egotrip
  • Guaja.cc
  • outros autores
  • Restaurantes
  • Sem categoria
  • Textos
©2025 Hanna Litwinski | Powered by SuperbThemes & WordPress