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Hanna Litwinski
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Hanna Litwinski

A VICTORIAPHOBIA MINHA DE CADA DIA

Posted on agosto 12, 2020agosto 12, 2020

Deve ser esse o termo científico, tão contraditório como a ação de recuar, temendo que seus projetos tenham êxito. O medo de dar certo. Eu carrego uma boa porção disso, que como os demais componentes da Phobias e associados, ataca como um Pokémon de efeito paralisante, me atinge e transforma numa coisiquinha diminuta e desbotada.

A euforia inicial, o autorreconhecimento por um bom trabalho em curso, de repente começam a ficar embaçados. Aí aparecem manchas localizadas que vão se espalhando como pulgões, cochonilhas, que muito rapidamente, tomam conta de toda a superfície e a sufocam. Os projetos literários morrem por asfixia, azulados e com lábios cerrados.

Depois vem a sensação torpe de desmonte, guiada pelo chicotinho da autodepreciação. Muitas vezes acompanha também um mecanismo desesperado de defesa, que pra tentar oxigenar a derrota da perseverança e salvá-la da morte iminente, aplica-lhe uma massagem de empáfia e realiza um boca-a-boca, insuflando um pseudo desprezo por aquilo que não vingou.

Não se trata exatamente da afamada síndrome do impostor, embora tenha pitadas disso, já que ambas fazem ninho em uma autoconfiança meio mexida e trabalham com a auto sabotagem. Eu sei dos meus méritos, me sinto bem, comparativamente a escritores cujo estilo me identifico. Embora isso não me poupe de ser repetidamente acometida pela inveja abissal de alguém ter feito um texto que eu poderia (e queria muito) ter escrito. Daquela grande sacada, o pulo perfeito do gato que me fascina pela sincronicidade do estalo, a bênção cabal da Gestalt. E da coragem de ter feito, a persistência no arremate.

Não sou ingênua e sei dos meus encantos literários, confio neles. Parte de mim é novela mexicana que se delicia vendo as lágrimas rolarem no rosto do leitor, seguidas por fungadas intervaladas. A outra, maior; é Anisiana e dá cambalhotas quando consegue provocar uma gaitada incontida. Afinal, o sujeito que tudo explica já nos avisou que a gente é de verdade, aquele que se acende através dos chistes. E não existe pra mim coisa mais bonita do que o humor bem-lançado.

A Victoriaphobia nasceu mais parecida com o peso prepotente do sucesso do que com a debilidade do fracasso, se filho feio tiver pai. Não é, necessariamente para a  crítica externa que ela performa – embora se nutra dela – ocorre numa rinha particular, lá no terreiro dos fundos. O embate do eu inventivo X o eu óbvio, a abordagem estimulante X tudo que já foi dito. A cada texto que me traz contentamento, ela aparece (tratemos por VP, afinal nesse ponto já contamos com alguma intimidade) indômita. Tenho inveja real das criaturas saltitantes que comemoram com enorme entusiasmo uns versinhos enjambrados, muitas vezes aconselhados de lições de vida. Eu sempre fui cigarra e não tive escolha, no meu quintal nasceu a “árvore da ciência” ao invés da robusta goiabeira de onde já disseram ser possível, trocar ideias com Jejé

Convivo com a esquiva diária da página em branco fazendo o Leão da Montanha; com o medo de ser autor de um só livro (que ainda não veio… caramba), com o pavor das frases feitas, do texto de efeito, da pobreza de recursos, da chatice autorreferenciada. A satisfação derivada de um texto bem-apessoado perdura só instante da cachimbada que entorpece. Evapora e se esvai para se dar lugar à nóia de não ser capaz de produzir outro texto de mesma tora. Medo de magoar alguém ou covardia pura?

Sei da alta quantidade de vaidade envolvida e da régua desmedida pela qual afiro minha crítica íntima. O que me faz sentir única, detentora de uma grande força criativa, também me tolhe e paralisa. E se o próximo texto não for tão bom? Melhor parar por aqui, não arriscar ser presa fácil da cafonice. É como se eu tivesse que sempre dar tudo de novo “de novo”. E é disso que se trata. Creio na criatividade como uma espécie de glúten, que quanto mais trabalhada, mais ativada fica, mas às vezes o pão não cresce simplesmente porque faltou calor.

Uma amiga me disse que eu não aceito elogios. É verdade, não lido bem com eles e não porque não me ache credora. É que eles me pesam, eles instantaneamente me sopram o bafo quente da expectativa do outro. Ser lido é o propósito de todo escritor, ora! E isso não medrará se a catatonia do próximo texto dominar a cena. O horror da mediocridade no sentido de banalidade mesmo, não pode ser maior que a capacitação pulsional e inventiva que os ensaios promovem. E se errar a mão? Não tem problema; sova outra massa.

Um dia vou praticar isso que já compreendo. Um dia, de verdade, me colocarei menos ao sabor da expectativa do outro. Darei uma banana pra paralisia e hei de mandar o exu de Narciso subir. Aí terá espaço para um espírito mais brando, que consome autocritica com moderação e tem convicção (e provas) de que o sol há de brilhar mais (muitas) uma vez.

 

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